17 gestores em 30 anos. Episódio #2 Aprendizados de um assédio moral e a descoberta de uma arma que eu precisava aprender a afiar, a comunicação.

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    Liderança

    17 gestores em 30 anos. Episódio #2 Aprendizados de um assédio moral e a descoberta de uma arma que eu precisava aprender a afiar, a comunicação.

    Por pouco não desisti. Eu era despreparada demais para lidar com aquele tipo de assédio moral e quase abandonei uma das melhores oportunidades profissionais que tive. Ao ouvir um sábio conselho, consegui focar no que era importante para mim e ter paciência para me libertar daquilo sem prejudicar minha carreira.

    Eu sequer sabia o que era assédio moral, até porque não existia este conceito naquela época. Os gestores faziam coisas inadmissíveis para os tempos atuais, mas eram considerados apenas uns “caras durões”. As grosserias em função de um mercado de trabalho competitivo eram infindáveis. Me lembro até hoje de frases típicas que eram ditas, como: “Tem uma fila de gente querendo seu emprego lá fora, então não me venha com conversa mole” ou “bebe o leite e não pergunta de onde vem a vaca”.

    Eu, particularmente, nunca passei por um constrangimento deste tipo no ambiente de trabalho, mas houve uma fase que quase me fez desistir. Hoje posso afirmar que o tipo de assédio que eu vivi foi dos mais perversos, o tipo silencioso e indetectável.

    Eu era bem inexperiente, estava no início da minha carreira e aquele era talvez o primeiro cargo que me dava um pouco mais de visibilidade do processo, contato com os gestores mediatos e alguns stakeholders. Eu amava tudo aquilo, aprendia muito todos os dias, as pessoas com quem eu trabalhava eram muito amigáveis e o ambiente bastante saudável. 

    Com o passar do tempo, houve uma mudança de gestão e quem assumiu a liderança da área era uma pessoa muito inteligente, do tido introspectiva, bem tímida, séria, sensível, contava ter uma vida simples de casa para o trabalho, era comprometida e seu forte não era lidar com pessoas. Antes de tornar-se minha gestora, essa pessoa havia me ensinado praticamente tudo o que eu fazia. Nos relacionávamos muito bem porque eu era ávida por conhecimento, queria aprender tudo e para ela isto era muito conveniente. 

    O time era bem pequeno, se me lembro bem não passávamos de 3 ou 4, e era uma área operacional que seguia uma rotina muito bem estabelecida. Claro que havia uma implantação ou outra mais complexa, mas no geral os desafios eram cumprir prazos, melhorar produtividade e reduzir incidência de erros. Então, olhando com a visão que tenho hoje, não era um grande desafio manter o time informado, coeso, dar feedbacks individuais frequentes, alinhar objetivos, etc. Os gestores eram treinados para isto ali, mas eu não via nada neste sentido. Por outro lado, eu também não sabia bem o que eram essas práticas, então não prestava atenção nisso.

    De repente, a relação que eu tinha com a gestora da área mudou e foi de um dia para o outro. Ela parou de conversar comigo, exceto em situações absolutamente necessárias e falava o mínimo, sem me olhar nos olhos. Eu fiquei confusa no começo. Ela era muito reservada mesmo e passou pela minha cabeça que estivesse com problemas pessoais. Então, me contive compreensivamente. O tempo foi passando e comecei a cogitar ser algo relacionado a mim diretamente. Cheguei a perguntar, meio sem jeito, eu era inexperiente, não sabia como abordar daquela situação, mas ela não me deu nenhuma abertura. 

    Quando me dei conta, eu estava totalmente bloqueada em relação a ela, meu trabalho se tornou um pesadelo, passei a odiar o que eu fazia, odiar estar alí, me culpava por não conseguir enfrentá-la, comecei a pensar em alternativas para sair e fugir daquela situação. Mesmo com muito pouca experiência, cogitava recomeçar do zero uma outra carreira, mais humanizada talvez. Eu sabia muito pouco sobre mim mesma, estava desorientada, não sabia nem por onde começar e precisava do emprego. Como eu poderia largar tudo? Eu estava isolada, sem saber o porquê. Certamente, algo a desagradou e eu nunca soube o que aconteceu, nunca tive a oportunidade de me explicar ou me desculpar apesar das tentativas frustradas de reaproximação.

    Achei que com o tempo a poeira pudesse baixar e a situação se reverter naturalmente, o que não aconteceu. Eu não tinha maturidade para enfrentá-la, me sentia paralisada e com medo de me prejudicar. Eu realmente falhei nas abordagens com ela e nenhuma tentativa resultou na reversão daquele silêncio. Não conseguia imaginar a hipótese de reclamar com o gestor mediato, pois ela era reconhecidamente muito boa, da confiança dele, como eu poderia me explicar? E assim, meses se passaram. 

    Meu pai foi meu primeiro chefe. Ele era bem das antigas, autoritário, teimoso, mas sempre houve uma ótima comunicação entre nós. Ele me ensinou muitas coisas importantes que me fortaleceram como mulher no ambiente corporativo e, neste episódio, em específico, penso que ele me trouxe uma reflexão bem realista:

    “Se você não tem controle de uma situação, só lhe resta aprender a lidar com ela, simplesmente porque se não supera-la agora, o futuro vai te cobrar passar por isto novamente. Outros chefes virão e o que você vai fazer se uma situação tão difícil quanto esta se repetir? Largar tudo mais uma vez e começar do zero de novo?”

    Eu fiquei e segui um tempo vivendo aquele misto de mágoa e desmotivação. Mas, focada no que estava sob o meu controle. Me esforcei para ser impecável no que eu fazia. De um curso do que era o Excel daquela época, eu automatizei todas as planilhas de controle de todos os contratos que estavam na minha carteira. Um trabalho que durava dias, passei a fazer em poucas horas. Meu case foi premiado num programa de produtividade operacional que pagava uma recompensa em dinheiro inclusive. Mas, nada se compararia à sensação de vitalidade que aquilo tudo me trazia. Não houve um parabéns sequer. 

    Finalmente, surgiu uma vaga do meu tamanho no quadro de oportunidades internas. Não me importei com o que era, me agarrei com unhas e dentes para conquistar aquela vaga e deu certo. Eu me livrei daquela gestora com a ciência de não ter resolvido a situação. Nunca mais nos falamos. 

    Eu me superei quando decidi focar na excelência do que eu fazia independentemente do reconhecimento dela. Mas, meu pai estava certo sobre lições mal aprendidas. É como na escola, quando você faz uma prova sem estar totalmente preparada, acaba ficando de recuperação. Você tem que fazer outra prova para passar de ano. Ele tinha razão, eu teria pela frente outras pessoas complicadas para lidar e a comunicação era a arma que eu precisava afiar.

    Descobri a fortaleza da minha resiliência, que sempre esteve presente nos tantos desafios que já enfrentei. Descobri também que eu não lidava bem com conversas difíceis e, de fato, me exigiram muita energia por muito anos da minha vida. Sempre foi complicado para mim e realmente o futuro me cobrou promover e enfrentar conversas difíceis inúmeras vezes para que uma situação não chegasse a um ponto insustentável. Fui melhorando aos poucos. Errando e acertando. Mas, sempre aquela situação vinha à minha mente e eu sabia que de nada adiantaria evitar e deixar o tempo resolver por si. Eu não estaria dando ao outro, nem a mim mesmo, a chance de nos comunicarmos e clarearmos nossos pontos de vista.   

    Eu aprendi com aquela gestora que a liderança acima de tudo é uma responsabilidade com pessoas. Aprendi também que é uma via de duas mãos e que não podemos supor o que nos parece óbvio. Aí entra a comunicação empática e verdadeira, uma ferramenta poderosa para qualquer relação saudável. Aprendi também que para algumas pessoas não é simples se comunicar, por razões diferentes. E, como tudo na vida, quando você tem visão clara do que precisa fazer, mesmo que não saiba como, se tiver nitidez das próprias dificuldades terá mais cautela e, com o tempo e alguma determinação, encontrará meios de aperfeiçoar estas competências. A partir daí, o que era difícil pode até continuar exigindo algum esforço adicional seu, mas você se torna mais capaz de fazer o que é preciso e faz.

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